O sequestro ao restaurante com final trágico
Foi uma madrugada de domingo de puro
terror no Pinhal Novo. Um homem matou um jovem militar da GNR e feriu seis
pessoas ao longo das quase sete horas em que permaneceu barricado dentro de um
restaurante, até ser morto durante uma operação policial, após negociações que
não surtiram qualquer efeito. O funeral do jovem militar da GNR decorreu esta
tarde em Santo André, com a presença do Ministro da Administração Interna,
Miguel Macedo.
GNR entrou no restaurante às 5.15 da manhã de domingo |
A vila de Pinhal Novo não dormiu no
passado domingo. Mikhael, um cidadão moldavo, que os “conhecidos” diziam ser “calmo,
calado e tranquilo”, provocou o terror na noite de sábado e toda a madrugada de
domingo no restaurante “O Refúgio”.
Ainda pouco se sabe das motivações de
um militar da ex-União Soviética que terá combatido no Afeganistão. O proprietário
do restaurante – um dos sequestrados por minutos – disse que Mikhel lhe terá
pedido dinheiro para tratar problemas de saúde mas outras informações correm em
Pinhal Novo e dão conta que o moldavo tinha planos de vida bem definidos.
Dois dias antes do atentado e de ter
assassinado o militar da GNR, o moldavo bombista tinha dito a amigos que ia
para França trabalhar. Tinha planos, bem traçados, que explicou sempre com a
calma habitual.
A conversa decorreu na passada
quinta-feira à tarde, entre Mikhael Codja, de 58 anos, e uma mulher, também
moldava, sua antiga vizinha. E este facto deixa ainda mais espantados os amigos
do homicida que, dois dias depois aquilo que o país e o mundo já viu e ouviu.
"Ele tinha planos de vida",
adiantou uma moldava que pediu o anonimato e que vivia no mesmo prédio, na Rua
D. Francisco de Almeida, no lado sul de Pinhal Novo, que há cerca de um mês
fora habitado por Mikhael, até não ter dinheiro para pagar a renda. Vivia num
carro e a sua mulher e filha o teriam deixado há um ano para regressar à sua
Moldávia. Era um homem desesperado, dizem alguns.
O despertar do terror
Gaspar Veloso disse ter "tirado" granada da mão do sequestrador |
No sábado de noite foi ao Restaurante “O
Refúgio”, cujo dono conhecia e já havia trabalhado como pintor, sentou-se numa
mesa, pediu um doce e por lá ficou a beber uísque. Bebeu um, depois outro e o
terceiro ficou intacto. Ainda terá pago a conta. Os últimos clientes tinham já
saído e dentro do restaurante ficou apenas os proprietários com os dois filhos.
E tudo terá começado ai.
Estava visivelmente transtornado.
Trazia granadas e explosivos e fez alguns reféns, amarrando com “braçadeiras de
plástico” Gaspar Veloso e seu filho, segundo este contou às estações de
televisão.
“Ele disse: vamos morrer aqui todos”,
relatou às estações de televisão SIC e TVI o proprietário do Restaurante O
Refúgio, Gaspar Veloso, que afastou categoricamente um cenário de eventual
ajuste de contas e revelou que o indivíduo lhe pediu “50 mil
euros”, alegando que estava doente e tinha apenas “um ano de vida”.
A filha de Gaspar conseguiu, entretanto,
pedir auxílio, telefonando para o 112. Bruno Chainho, de 30 anos, desde 2010 na
GNR, integrava a primeira patrulha a chegar ao local e foi baleado no rosto,
sem poder ser socorrido. Ainda assim conseguiu libertar as duas mulheres de
dentro do Refúgio”.
A fuga dos últimos reféns
Interior do restaurante onde o homem se barricou |
O
imigrante parecia muito perturbado depois de ter alvejado o jovem militar da
GNR. “Li nos olhos dele e vi que ele ponderou e pensou duas vezes: 'Estou
desgraçado'”, descreveu Gaspar Veloso, acrescentando que conseguiu soltar a
braçadeira que o prendia ao filho, atirar-se “para cima” do indivíduo e
retirar-lhe uma granada da mão.
“Corri para a porta e mandei a
granada”, descreveu, sem conseguir precisar se foi esta que feriu os militares
da GNR no exterior. Depois disto, o imigrante voltou a empunhar a arma, mas o
filho de Gaspar terá conseguido dar-lhe um murro e fugir. Ficou o GNR, já
atingido a tiro, e o homem armado com uma pistola, várias granadas e um
explosivo artesanal.
O dono do restaurante, que também
trabalha na construção civil, admitiu que Mikhael, colaborou com um
subempreiteiro seu há 11 anos, quando construiu aquele bairro no Pinhal Novo,
mas garantiu que ele nunca lhe pediu trabalho nem lhe conhecia quaisquer
comportamentos agressivos.
As tentativas para uma rendição que nunca chegou
Ao longo da madrugada, apesar de todas
as tentativas, a equipa de negociadores mobilizada para o local não conseguiu
convencê-lo a render-se nem a permitir que o militar baleado fosse socorrido.
“O indivíduo recusava-se a negociar”, explicou o porta-voz da GNR de Setúbal,
tenente-coronel Jorge Goulão. Nas horas que se seguiram, o efectivo da GNR foi
reforçado e foi criado um enorme perímetro de segurança em torno do
restaurante, que fica localizado num bairro residencial do Pinhal Novo. A rua
foi cortada ao trânsito e várias habitações foram mesmo evacuadas, por
precaução.
A GNR chegou a levar ao local um
antigo colega do barricado, para o tentar convencer, comunicando por megafone,
a render-se ou a permitir pelo menos o auxílio ao militar alvejado. Mas ele
terá dito que preferia morrer a sair. Cumpriu o objectivo.
Após mais de seis horas de
negociações, a GNR – que descreveu esta operação como de “alto
risco” e “inédita” pelo grau de violência – avançou com uma intervenção
táctica, às 5h17, depois de o homem ter morto um cão das brigadas cinotécnicas
e ferido outro. A entrada dos cães serviram para poupar mais vidas humanas. A ideia
era que os cães imobilizassem o homem. Não conseguiram mas abriram caminho para
que a GNR conseguisse atingir o homem que acabou por morrer no local.
Associação da GNR lamenta “falta” de
efectivos
Associação da GNR quer mais militares nos quartéis |
A Associação Sócio-Profissional Independente da Guarda (ASPIG) alertou para a
falta de mais de cinco mil efectivos na GNR, considerando que põe em perigo a
segurança dos militares por falta de apoio nas patrulhas. A morte de um militar
da GNR durante a operação num restaurante no Pinhal Novo levou o presidente da
ASPIG, José Alho, a chamar a atenção para a situação em que trabalham muitos.
"Quem padece são sempre os
patrulheiros da guarda. São sempre os mal-amados e são sempre os que morrem,
porque são os que vão ao primeiro contacto", afirmou, lembrando que o
quadro orgânico da GNR definia a necessidade de cerca de 28 mil efectivos, mas
actualmente tem menos de 23 mil. "Todos os dias temos militares a
serem agredidos. Todos os dias temos detenções de pessoas por agredirem os
militares", lamentou.
Já a Associação Profissional dos
Guardas (APG/GNR) considerou que o incidente no restaurante do Pinhal Novo
contraria as garantias do ministro da Administração Interna sobre a segurança
pública. Em comunicado, a APG/GNR afirma que o episódio no qual morreram
dois homens demonstra que "a criminalidade se tem tornado, além de mais
violenta, cada vez mais eficaz e sofisticada", e o "oposto" do
que sugere o ministro da Administração Interna, Miguel Macedo.
O último adeus a Bruno Chainho
Funeral de Bruno Chainho realizou-se esta terça-feira |
Centenas de pessoas marcaram presença
esta terça-feira no último adeus a Bruno Chainho, o militar da GNR abatido a
tiro durante o sequestro no Pinhal Novo.
A igreja da Aldeia de Santo André, em
Santiago do Cacém, de onde era natural, foi pequena demais para acolher todos
os que se quiseram despedir do jovem que servia na Guarda Nacional Republicana
há quatro anos.
Também o ministro da administração
interna, Miguel Macedo, e o comandante-geral da GNR, Newton Parreira, quiseram
marcar presença na última homenagem.
O funeral, que decorreu com honras
militares, juntou a população em peso e uma grande representação de todos os
serviços da GNR e de alguns ramos das Forças Armadas. Carregada pelos
companheiros de profissão, a urna seguiu coberta pela bandeira nacional num
gesto que mostra o reconhecimento da missão desempenhada pelo militar falecido.
Quem conhecia Bruno descreve-o como um
rapaz prestável e amigo de toda gente. Os pais, amigos e familiares mais
próximos não esconderam a emoção de ver partir o ente querido.
Bruno
Chainho, solteiro, era natural de Santiago de Cacém e estava de serviço no
posto de Pinhal Novo há quatro meses. Foi atingido pelo sequestrador mal entrou
no restaurante "O Refúgio". Ainda assim conseguiu salvar mãe e filha
do restaurante.
Bruno tinha prestado serviço militar nos
fuzileiros, após o que ingressou na GNR. Esteve colocado no Algarve e há quatro
meses que estava destacado no posto de Pinhal Novo.
O jovem guarda foi o primeiro a abordar o homem no
restaurante e terá sido atingido com um tiro. Depois ficou no interior do
estabelecimento durante sete horas até a GNR tomar de assalto o restaurante.
Paulo Jorge Oliveira
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