Impressões Digitais by Paulo Jorge Oliveira

Para onde caminha o nosso futebol?
Numa entrevista à SIC, Pinto da Costa, presidente do Futebol Clube do Porto, fez um comovente choradinho: o aumento do IVA sobre os bilhetes dos jogos e o facto dos salários e seguros dos atletas da seleção serem pagos pelos clubes. “É sempre a malhar nos clubes”. Sou contra o aumento do IVA, do qual apenas resultará uma contração da economia e, a médio prazo, por esta razão, uma redução das receitas fiscais. E sou contra o aumento do IVA nos bens essenciais e nos serviços culturais que vivem, quase somente, das receitas de bilheteira. E se na cultura a subida do imposto resultaria na morte “imediata” de muitas companhias, no futebol não é assim.


Basta olhar para orçamentos dos clubes para perceber que isso não acontece com o futebol. Olhe-se, por exemplo, para as contas do FC Porto. Segundo a imprensa desportiva brasileira e portuguesa, Danilo, um promissor defesa-direito brasileiro, foi contratado por quase 20 milhões de euros. Falcão terá sido vendido por 45 milhões. Hulck, diz o presidente, só sai por 100 milhões. Ora, números astronómicos e que mostra que o dinheiro é fácil para estes senhores. O mesmo digo e escrevo de Benfica e Sporting, que gastam milhares de euros em passes de jogadores como se o futebol vivesse à margem da crise. Logo, não adianta culparem o IVA para dizer que o Estado malha nos clubes. Na verdade, o Estado já perdoou aos grandes do futebol português muito dinheiro. Vários estádios novos – incluindo o do Dragão – só foram feitos graças a apoio do Estado, ou seja: de todos os contribuintes.

Segunda razão: considera-se, e bem, que sem cultura um país não existe. Mesmo sendo um amante do futebol, seria incapaz de fazer a mesma afirmação em relação a ele. Quanto ao segundo choradinho, parece-me que nem merece grande debate. As competições internacionais em que a Seleção participa valorizam um ativo. E são os clubes, e não a Federação Portuguesa de Futebol, que irão receber os dividendos dessa valorização. Querem dividir os ganhos ou apenas os custos.

Mas a indústria do futebol não deve ser olhada toda da mesma forma. Se os grandes do futebol tudo podem – e até podem fazer asneiras financeiras com aval dos bancos, como é o caso do Sporting deste ano – há outros que nada podem fazer e vivem com a corda na garganta. E para estes, soluções não existem. E aqui sim, o Estado assobia para o lado e finge que não é nada com ele.
São às centenas os sites que proliferam pela Internet incentivando o "jogo online", desde casas de apostas de eventos desportivos, casinos, a casas de poker, todo um novo mercado que se estima que gere aproximadamente 700 milhões de euros por ano, segundo especialistas da área.
Um "mercado virgem" para o Governo português e que necessitava da sua intervenção, não para o esmagar, porque admitamos dada a facilidade de acesso aliado a campanhas de marketing agressivas e o apelo natural do dinheiro fácil, tornam este fenómeno inevitável, ainda mais numa altura de crise, exigia-se a presença do Estado com uma lógica de legislador, de elaborar leis que determinem a conduta entre casas de apostas e apostadores e do regulador, verificar se existe seriedade no produto que é oferecido pelas casas e se as condições são cumpridas.
Qual o prémio desta intervenção? Num negócio que movimenta 700 milhões de euros/ano só em Portugal, são tudo receitas de Economia Paralela, a escapar a IRC, além de uma possível retenção na fonte de 25% a 35% dos ganhos como acontece com os jogos da Santa Casa e que tanto jeito dariam ao Estado Português nesta altura, além do elemento dissuasor que adicionariam, visto que os ganhos seriam menores.
Neste momento o mercado das apostas online é uma selva, sobrevive à custa da boa fé e reputação entre casas de apostas e apostadores, mas a corda parte sempre do lado mais fraco e num mercado que se pensa que poderão existir aproximadamente 200 mil portugueses ativos deve haver quem proteja os seus direitos.
Vários países da União Europeia caminham para a regulamentação ou já é legal apostar, como acontece no Reino Unido, Grécia, Polónia, Espanha, Dinamarca, Irlanda, Holanda e em discussão na Alemanha.
A grande força de bloqueio em Portugal pensa-se que será a Santa Casa e os Casinos Físicos, ambos sentem os seus monopólios naturais ameaçados, é preciso ter em conta que o fim da Santa Casa é o apoio aos mais desfavorecidos e os Casinos são fortemente tributados para desempenharem a sua atividade, mas o facto de o "jogo online" estar a ganhar muito mais adeptos do que os jogos de azar convencionais, além da disponibilidade de acesso imediato, prende-se com a possibilidade de com pequenas somas se poder ganhar valores consideráveis sem as probabilidades mirabolantes de um Euromilhões, onde até os prémios mais baixos têm uma probabilidade de acerto muito reduzida.



O irónico no meio disto tudo é que são as casas de apostas como a Bwin e Betclic, consideradas clandestinas, que estão a patrocinar e assegurar a sobrevivência de muitos clubes da liga portuguesa, a Betclic chega a patrocinar 20 das principais equipas nacionais. A Bwin patrocinava a Taça da Liga... até ordem do tribunal que impede agora os clubes de receber uma verba importante. O mesmo pode acontecer com os contratos da Betclic que, a ser impedidos por ordem judicial, pode matar as médias e pequenas equipas do nosso futebol. E perante isso, não vejo os dirigentes fazer nada, não vejo o Estado a trabalhar na proposta para regular as apostas online, não vejo os adeptos preocupados, não vejo nem Pinto da Costa, nem Luís Filipe Vieira, nem Godinho Lopes nem o novo presidente da Federação Portuguesa de Futebol dizer uma palavra. Porquê? Porque lhe interessa os “seus negócios”, as comissões dos jogadores, os patrocínios chorudos das empresas de comunicação, das verbas dos direitos televisivos e pouco mais interessa.
Um dia, quando só existir quatro a cinco equipas em Portugal, qual será a verdade desportiva? Vejo muita gente a discutir o alargamento da principal liga... talvez daqui a uns anos a liga portuguesa será Benfica, FC Porto, Sporting e as equipas B, C e D destes mesmos clubes a jogarem entre si se nada for feito.



  
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