Pais fazem ultimato ao Conselho Oficial da Praxe
O inquérito aos trágicos acontecimentos na praia do
Meco, em Sesimbra, onde seis estudantes da Universidade Lusófona perderam a
vida, passou a estar sob segredo de Justiça por determinação da
Procuradoria-Geral da República, tendo também mudado de mãos. Está agora na
alçada do tribunal de Almada. Os pais dos jovens querem saber o que realmente aconteceu.
Fátima Negrão, mãe de uma das vítimas, confirmou ao jornal Público que o
Conselho Oficial da Praxe Académica foi contactado e tem até quinta-feira para
explicar o que se passou com os jovens. O único sobrevivente está a ser seguido por
especialistas e em “amnésia selectiva”.
Tragédia do Meco continua sem respostas claras |
Ou seja, a partir desta terça feira o inquérito passou
a estar sob a alçada do Procurador-coordenador da Comarca de Almada,
abandonando o Ministério Público de Sesimbra.
Cabe agora ao Tribunal de Almada averiguar o que se
passou na noite de 15 Dezembro, quando seis estudantes da Lusófona perderam a
vida arrastados por uma onda gigante na praia do Moinho de Baixo, onde chegaram
trajados após uma longa caminhada - cerca de oito quilómetros - a partir de
Aiana de Cima.
Foi naquela localidade de Alfarim que alugaram uma
casa para um fim-de-semana envolto em secretismo, no qual participaram os
representantes dos vários cursos na Comissão de Praxe, liderada por João
Gouveia, o único sobrevivente, de quem os pais das vítimas procuram
desesperados todas as respostas sobre o que se passou naquela noite.
Como é que os nossos filhos morreram?", é só essa
a pergunta a que querem ter resposta. Os pais dos seis jovens que morreram no
mês passado, na Praia do Moinho de Baixo, no Meco, depois de terem sido levados
por uma onda, contactaram o Conselho Oficial da Praxe Académica (COPA) da
Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, em Lisboa, e deram aos seus
membros até quinta-feira para dizerem o que se passou, conta a mãe de uma das
vítimas, Pedro Negrão. A partir daí, afirma, usarão todos os meios para obter
respostas. O caso está em segredo de justiça.
As perguntasse as
dúvidas dos pais
Segundo informação avançada pelo gabinete do chefe do
Estado-Maior da Armada e Autoridade Marítima Nacional, "o processo foi
avocado pelo procurador coordenador do Tribunal da Comarca de Almada, que
decretou segredo de justiça". Por isso, "nenhum dado que conste no
processo poderá ser disponibilizado".
Mas os pais pedem respostas. A mãe de Pedro Negrão, o
jovem de 24 anos que era o responsável pelas praxes para o seu curso (Gestão),
diz que os pais, que se reuniram este sábado para decidir o que vão fazer, têm
muita informação recolhida mas também "muitas pontas soltas", notando
que só quem está envolvido nas praxes saberá dar-lhes mais informação. "Os
nossos filhos estavam lá de livre vontade, queríamos preservar o Conselho
Oficial da Praxe Académica", disse ao jornal Público.
"Fizemos uma comunicação ao Conselho de Oficial
da Praxe Académica para que falem entre eles e tomem a iniciativa de vir falar
connosco. Vimos apelar ao bom senso", diz Fátima Negrão. Se insistirem em
manter o silêncio, os pais tomarão outras medidas, desde jurídicas à divulgação
de mais informações para a comunicação social, sublinha. João Gouveia, o dux que
liderava a comissão de praxes na altura do ocorrido, e que é o único
sobrevivente, vai ser ouvido pela Polícia Marítima de Setúbal em quem o
Ministério Público delegou a audição.
Pedro
e Catarina tinham medo do mar
Fátima Negrão conta ainda que o filho era pouco amigo
do mar. Têm uma casa em Odeceixe, no litoral alentejano, e Pedro só ia ao mar
depois de muita insistência. Já outra das jovens, Carina Sanchez, " tinha
pânico da água, tinha pavor às ondas, só ia à água com o namorado, isto dito
pelo próprio", diz.
A mãe diz que o filho apenas lhe disse que ia passar
um fim-de-semana com amigos da faculdade numa casa alugada. "Pediu-me para
lhe ter prontas as duas camisas do traje académico, uma para sábado, outra para
domingo." A um amigo contou que "ia ser um fim-de-semana duro",
lembra.
Segundo Fátima Negrão, entre as 21 e as 22 horas os
jovens foram vistos no Café Central em Alfarim, a cerca de dois quilómetros da
praia do Moinho de Baixo. Já a proprietária do bar da praia referiu ter fechado
o estabelecimento próximo da meia-noite e garante que “era noite de lua cheia,
a essa hora olhou para o areal em frente e ninguém estava na praia”. O alerta
do sobrevivente foi dado por volta da uma da manhã. O que aconteceu neste
período?
"Ninguém quer arranjar culpados, só queremos
saber a verdade", diz Fernanda Cristóvão, mãe de Catarina Soares, outra
das vítimas, explicando que "esta angústia está a transformar-se noutros
sentimentos, em revolta".
Encontros
habituais
Fábio Jerónimo, o nome avançado ontem pela Associação
Académica da Lusófona como sendo "o responsável pelo COPA", em
substituição de João Gouveia, diz que não foi contactado pelos pais. Mas,
sublinha, também não tinha de ser. Isto porque, garante, não é o novo
responsável pelo COPA, ao contrário do que informou a associação académica.
Aliás, já terminou os estudos, diz.
Fábio Jerónimo explica ainda que conhecia os jovens
que morreram na praia, no Meco. "Éramos amigos." Garante, contudo,
que não participou na organização do fim-de-semana. Este tipo de encontros
aconteciam "todos os anos", por vezes mais do que uma vez e podiam
participar "todos os trajados". Mas neste, diz, eram apenas sete
"e só quem lá esteve pode saber" o que se passou.
Sobrevivente com
amnésia selectiva
O sobrevivente tem estado em silêncio desde o momento
em que contou à Polícia Marítima a sua versão do que se passou no próprio dia
em que a "onda cavaleira" - como é conhecida pelos pescadores da
terra - surpreendeu os jovens, continuando a ser acompanhado por um psicólogo
da Universidade que lhe terá diagnosticado "amnésia selectiva".
Apesar da insistência dos pais em conhecerem o relato
que o jovem tem para fazer, os psicólogos dizem que João Gouveia ainda não tem
condições psicológicas para tal. O jovem está resguardado em casa, tendo
faltado à época de exames e nunca mais foi visto na academia, nem no café em
frente, onde trabalhava.
Agência
de Notícias
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